terça-feira, 29 de março de 2011

Fatos nada pós-modernos

Parece piada ou chacota o pronunciamento do Bispo católico da região de Garibaldi, cidade da serra gaúcha, que advertiu um casamento em que os noivos foram vestidos como os personagens Fiona e Shrek. Certamente se não tivessemos meios de comunicação, filmagem e depoimentos, e eu ficaria apenas sabendo por meio de conversas de rodas; eu jamais iria acreditar.



Sabem por quê??? Já vi casamentos de todos os tipos. Mulheres barrigudas, prestes a ganhar o bebê, vestidas de branco, com véu e ainda com muitas saias de armação. Espero não deixar que isso soe preconceituoso, mas convenhamos, não é mais que uma gafe. Simplesmente não combina. Mesmo assim, a Igreja e todo o seu aparato ideológico perpassou coisas mais fantasiosas. Casamentos extremamente glamourosos, com cerimoniais extensos e noivas com vestidos vermelhos - já fui num.

Ninguém consegue me convencer que foi algo errado. Quem sabe a Igreja esteja com medo de que muitas outras façam parecido. E teria algum problema? Afinal qual é o propósito do casamento? Unir duas pessoas no amor de Deus? Pois se este motivo nobre fosse levado à risca da faca, meu bisavó diria que podemos nos unir a Deus até em frente a um toco de madeira - FICAADICA.

Entre tantas outras barbaridades de uma sociedade que deveria ser pós-moderna (não vejo nem a modernidade, quiçá a pós), tenho que acreditar que as pessoas além de eleger políticos corruptos, elegem e pior, compartilham ideologias com o péssimo deputado federal Jair Bolsonaro (PP- RJ). Ontem num quadro do programa CQC da Band ele envergonhou o nosso Congresso. Muitos esquecem de ver por esta ótica, afinal o Congresso Nacional tem como objetivo a representação do povo brasileiro, das múltiplas opiniões, no entanto, nossa Constituição deixa extremamente claro alguns princípios irrevogáveis, dos quais Bolsonaro simplesmente esquece. Alguns o consideram apenas um palhação que defende ideias patriarcais, eu me recolho e o observo com parcimônia.



Dica de uma matéria para entender melhor o proconceito aos gays em nossa sociedade. Matéria da época: Amor - e ódio - ao gays.

segunda-feira, 28 de março de 2011

O Prazer e Culpa


CONTARDO CALLIGARIS (Folha Ilustrada - dia 24/03/2011)

Os jovens são levados a pensar que é só frustrando seus próprios desejos que ganham o amor dos adultos


ADMIREI A reação dos japoneses diante do desastre -terremoto, tsunami, contaminação nuclear. Nas declarações oficiais e nas palavras das vítimas, a catástrofe é apenas um acidente: pode haver responsáveis por falhas na prevenção, na segurança ou nos socorros, mas a catástrofe em si não tem sentido algum. Será que nós, ocidentais, seríamos capazes da mesma atitude? Não sei.

A peste assolou repetidamente a Europa do século 14 ao 18. A primeira grande epidemia, de 1347 a 1352, matou um quarto da população europeia. Para que o horror não induzisse ninguém a pensar que o universo era sem sentido, duas reações populares: 1) perseguir judeus e bruxas, supostamente responsáveis pelo contágio; 2) juntar-se aos flagelantes, penitentes que erravam pelo continente se fustigando até o sangue. Para o flagelante, a peste era um castigo pelos pecados do mundo; portanto, punir-se por eles talvez fosse o jeito de tornar a peste desnecessária.

Naqueles quatro séculos, a Europa se cobriu de igrejas que eram construídas como oferendas para que a epidemia se acalmasse; nelas, homens e mulheres faziam promessas, pedindo para serem poupados.

Ainda hoje, na calamidade e no medo, a promessa que acompanha o pedido feito a Deus ou aos santos sempre propõe uma renúncia: o pedinte se engaja a se privar de algo, do sexo ao chocolate. Funciona assim: 1) meu prazer e meu gozo são sempre culpados, 2) portanto, qualquer mal que me assole se explica como punição de minhas culpas, 3) a renúncia aos meus prazeres pode me redimir e estancar a punição.

Como chegamos a fazer esse estranho uso dos prazeres, ou melhor, da renúncia aos nossos prazeres? Três respostas, não excludentes (e insuficientes).
1) Bem ou mal, educar implica conter, impor frustrações e renúncias. Com isso, a aprovação dos educadores sempre parece proporcional à aceitação das renúncias pelos educandos. Ou seja, os jovens podem ser levados a pensar que é só frustrando seus próprios desejos que eles ganham o amor dos adultos.
2) No fim do primeiro milênio, cada vila européia vivia no medo de bandos errantes. Quando eles se aproximavam, o povo se reunia na igrejinha e rezava. Isso não impedia nem saques nem estupros. O que pensar quando os bandidos iam embora? Deus não nos protege porque não existe? Deus existe, mas não dá a menor para a gente? Devia triunfar a versão que conciliava o desastre com a existência de Deus: o próprio Deus mandou os bandidos para nos punir de nossos pecados.
3) Talvez seja menos angustiante viver num mundo que faz sentido do que num mundo que não teria sentido algum. Por exemplo, como é que você aguentaria o pensamento da morte futura sem o conforto da ideia de que ela está incluída numa ordem cósmica ou num plano divino?

Infelizmente, esse conforto tem um custo alto, pois o jeito mais fácil de garantir a existência de um sentido do mundo consiste em me atribuir a culpa por todos os males. Ou seja, minha culpa e meu esforço para me redimir "provam" que existe uma ordem (justamente, a que eu ofendia quando me entregava a meus prazeres).

Corolário: se meus prazeres culpados são a causa dos males, não preciso responder "adequadamente" às calamidades, bastará modificar minha conduta de modo que minhas ofensas sejam perdoadas.

Além de dar sentido ao meu mundo, a culpa me oferece a ilusão de agir de maneira eficaz: como o flagelante, posso esperar que minha renúncia ao prazer suspenda a punição. De repente, doenças e catástrofes talvez parem diante de minha conduta meritória. Em vez (ou além) de procurar as condições de prevenir um terremoto ou de debelar um câncer resistente, rezarei noite e dia e me fustigarei em penitência. Se, de qualquer forma, o terremoto vier ou o câncer triunfar, será porque não me açoitei o suficiente.

Pois bem, não acredito que, em nossa cultura, esse bizarro uso dos prazeres e da culpa tenha mudado substancialmente nos últimos sete séculos. Continuamos fundamentalmente inimigos do nosso prazer.

Prova disso: há, hoje como no século 14, bandos errantes que denunciam nossos tempos "hedonistas" e nossa voracidade por prazeres e gozos. São os flagelantes verbais: criticam o prazer para fomentar a culpa. É o jeito (custoso) que eles acharam para dar sentido ao mundo.

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Sinceramente, eu não sou fã do povo japonês. Gosto de traços da cultura e sobretudo a sua culinária. Mesmo assim, nunca me agradou aquele jeitinho pacífico de viver. Me parece um tanto sem vida (ou sou exageramente entusiasmado com tudo e gosto de mostrar isso) os seus modos. Entretanto, necessito dizer que nesse aspecto (levantado por Calligaris) eles são os mestres. Buscamos demais achar um culpado - eles estão pouco preocupados com os culpados, até demais - e deixamos esta culpa influenciar nosso jeito de ser. Isso diz respeito há várias situações da nossa vida. Texto bom para refletir.

Uma boa semana!

quinta-feira, 3 de março de 2011

Conquistando (no gerúndio mesmo)

Universidade federal expulsa aluno de medicina que escreveu e-mail ofendendo gays no RS

Este fato não se tornou muito assunto da mídia (contexto). Normal digamos. O X da questão do problema, num resumo, podemos considerar todos os comentários. Um pouco de culpa da família, do sistema, enfim, do envolto, mas também, convenhamos, ninguém é tão criança que não sabe discernir entre o que é respeito ou não. Penso que está diretamente ligado com o respeito ao outro, muito mais do que ideologia ou pré-conceitos. Olhem só o que aconteceu com os ciclistas no último final de semana, também em Porto Alegre. Me entristece saber que estamos presenciando cenas assim na amada capital do pôr-do-sol do guaíba.

Acredito que estamos num momento propício, o circo está armado literalmente, temos representatividade no poder e hoje sabemos de uma forma material o quão somos fortes enquanto público consumidor. Fato que por vezes não levamos em conta, mas quem sabe é o nosso poder maior. Desejo que atritos assim surgam, não pensando somente do lado negativo, porém que estes fatos muitos vezes velados venham à tona, para que possamos conhecer, discutir e quem sabe reverter um pouco este quadro comportamental que tanto me assusta.

Olhos atentos