domingo, 31 de maio de 2009

“É 1% inspiração e 99% transpiração...”

Trabalhos acadêmicos.


Bom, academia, não aquela de movimentar os corpos, mas aquela de movimentar neurônios e agradecer profundamente quando esses realizam suas sinapses e, mais ainda, quando dessas sinapses resultam grandes idéias. Verbalizar essas sinapses é um desafio e uma tarefa difícil e que pressupõe uma dose de diálogo. Deveria ser com a sociedade, mas bem se sabe que academia e sociedade não necessariamente são coisas afeitas a trocas. Há quase que um abismo entre os acadêmicos e as pessoas ‘normais’. Abismo que se amplia se no lugar das pessoas normais, se colocar ‘relevância para (problemas da) a sociedade’.

Então, num belo dia da sua graduação você ouve a bendita (ou seria maldita?) voz interior: “siga seu caminho estudando essa questão”. Desde então você decide ingressar no, até então, adorável e encantador mundo dos congressos (e assemelhados), da iniciação científica, dos projetos, dos artigos, dos resumos, dos resumos expandidos, dos posteres, da exposição oral, do famigerado power point, do Lattes (ah, o lattes...). Ufa! Desde a resolução pela academia, você já começa a pensar em ingressar no mestrado. Não há dia em que não pense nisso, que não tente articular o seu ingresso no mestrado. Pois bem, você consegue.

E aí?


Bom, além de você perceber de cara que estabilidade financeira e renda ‘boa’ não farão parte da sua vida (pare de se espelhar nos seus professores e dizer “mas eles ganham bem”. Muitos deles estão pra se aposentar, ou seja, ingressaram em outros tempos. Hoje em dia, educação superior tá em descaso alarmante e a pesquisa, no Brasil, não é muito bem conduzida – especialmente se a sua área for ‘ciências humanas’). Em seguida, você se conscientiza que competição, concorrência não são privilégios do setor privado. O próximo passo é se dar conta de uma vez por todas, que você não vai mudar o mundo coisa alguma. Pelo contrário, a academia pode (e quase sempre consegue) lhe transformar num burocrata intelectual (‘publiquei três artigos nesse semestre! Posso ser promovido, agora’) que, por sua vez, te dará uma visão bem reformista dos problemas sociais em geral. E nisso tudo, fome, pobreza, desemprego etc etc vão sendo deixados de lado. Bom, quem sabe um dia isso se resolva...

Mas, o maior terror da vida acadêmica (antes da alforria, leia-se, doutoramento), é a dissertação (ou tese). É quase que consensual (tacitamente) entre a categoria que mestrandos e doutorandos possuem a obrigação de escrever trabalhos relevantes, decentes, comprometidos e bem acabados. Então, você PÁRA com a sua vida e se senta em frente a um computador (depois de já ter fichado meio mundo de livros, papers e afins) pra escrever suas idéias. Muito cuidado, idéias escritas por outrem. Sua grande contribuição se dará a partir dos resultados da metodologia que você aplicou. Bom, isso se você conseguir descobrir um método bom e substancioso. Do contrário, o seu sofrimento será proporcionalmente maior à incompreensão de ‘como você vai fazer/desenvolver’ o seu problema de pesquisa.

Ah, escrever é tão nobre, não? Até pode ser para autores de livros agradáveis (literatura em geral), mas para você, acadêmico, será uma OBRIGAÇÃO! Até porque os prazos são exíguos, você não poderá se dar ao luxo de escrever apenas quando boas idéias lhe ocorrerem. E no estado de pressão, de vida pessoal parada e tudo o mais, boas idéias acabam se tornando mais difíceis de surgirem nessa sua adorável mente brilhante. Claro, você conseguirá defender a sua dissertação/tese (nem vou comentar sobre isso, porque não quero, se quer, pensar nesse dia) e mandá-la para a biblioteca. E aí? Bom, se você tiver feito um trabalho estupendo, tem a oportunidade de tê-lo publicado em livro e até mesmo de ser usado em aulas de disciplinas. Mas, dificilmente será usado para tratar o problema ao qual você dedicou sua vida.


Calma, não se desespere. Vá trabalhar em outras coisas, tente se aproximar da realidade e, se tiver fôlego, volte para fazer o doutorado. Você poderá ser alforriado!! E depois? Humm, aí vem a melhor parte: desemprego, pelo menos por um tempo. Mas para quem enfrentou tudo isso, e para quem já se acostumou com pouco dinheiro, uns meses sem grana não serão nada.


Amém.


Porque, afinal de contas, o que vale é a sua paixão pelo seu tema, seu problema de estudo. O resto é o resto.

(Ressalva-se que o texto é amplamente voltado para mestrandos/doutorandos da área de ciências humanas. Além disso, não se trata de uma regra estrita)

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